sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Transatlântico da Mediocridade


Faça suas malas, saque sua passagem e se prepare para embarcar. Não se preocupe, a viagem será tranquila. Muito tranquila. Irritantemente tranquila. Você conhecerá o lado mais irrelevante da mente humana. Aquela zona entre a racionalidade e a paixão. Entre o cômico e o bizarro. Entre a mentira e a ignorância. Acomode-se, meu caro, zarparemos em instantes. Não se esqueça do colete salva-vidas, seu cérebro agradecerá.  Mas deixemos de delongas, sem mais intervalos comerciais. Aproxime-se e embarque no magnífico, no extraordinário, no abominável e odiado: Transatlântico da Mediocridade.

Todos os domingos – dia da semana de popularidade questionável – nos deparamos, em algum momento do dia, com aquela situação em que tudo que poderíamos fazer desaparece. Sejam os importantes compromissos do trabalho, sejam os prazerosos passatempos.

De repente, você é a pessoa mais livre do mundo - os operadores de telemarketing morreriam de inveja. E aí você começa a vagar, como um zumbi que comeu todos os cérebros de uma ilha. Todos exceto o próprio. É aí que você tem a visão. Lá longe, no horizonte, mas se aproximando, o agregado do submundo da cultura surge. Navegando pelas águas calmas e sem ventos, o temível Transatlântico da Mediocridade dá o ar de sua desgraça. Você não tem escolha e embarca.

Sem sair do seu sofá, você começa a imergir no vasto conteúdo pouco aderível do transatlântico. Em um contexto onde o tempo é totalmente desconsiderável, você anda em círculos em um arquipélago de igrejas – com o número da conta na tela -, produtos extremamente necessários, e programas de duração infinita. Entre as ilhas, uma ou outra notícia seríssima e um jogo de futebol.

A bordo do show de horrores navegante, você avista a primeira parada do transatlântico, a Ilha do Missionário. O barco atraca, você desembarca e tudo começa com uma pequena contribuição financeira para entrar no local. Tudo bem, você paga para ver. Um grande templo ocupa boa parte da área.

É grandioso e luxuoso. Um verdadeiro palácio celestial. Lá dentro, milhares de pessoas se exaltam regidas por um astuto pastor. Ele esbraveja e se movimenta de maneira elétrica. O som é potente, a voz do pastor também. Ele começa a descrever milagres, depois começa a distribuir milagres. Pessoas voltam a andar, outras a enxergar. Tudo está acontecendo. Na verdade é tudo meio que um milagre, principalmente você parar ali, mas o difícil agora é sair.

O pastor cessa um pouco a enxurrada milagrosa e começa a falar da importância de selecionar conteúdo adequado, sem interferência do mundo (irônico!). Logo depois, apresenta a milagrosa TV à cabo abençoada. Um fiel telespectador relata sua mudança de vida. Ele bebia, fumava, batia na mulher. Depois da TV, tudo mudou. Os filmes devem ser realmente muito bons.

O pastor continua sua pregação. Você não sabe por que, mas ainda está dentro do templo, fixado nas palavras do pastor. Leitura do salmo 126, contribuição de R$ 126,00. Relógio incessante da oração, um dinheirinho para a bateria. E assim vai. Você está quase zerado, o pastor arremata com mais um ou dois milagres e então você ouve o apito e acorda. Hora de partir. O transatlântico continua a navegar. Você está muito feliz, quem tem tanto dinheiro para igrejas? Então você avista uma ilha, é a Ilha Polishop. Sua felicidade termina, seu dinheiro também.

 A ilha é bastante peculiar, a começar pelas suas cores. É uma coisa estranha, todo lugar da ilha é composto por uma parte colorida e outra parte em preto e branco.

Você começa a caminhar. De cara você vê duas mulheres varrendo o chão. Uma, em preto e branco, parece sofrer enquanto varre com uma vassoura comum. Ela faz cara de dor, enxuga o suor da testa e parece irritada. Suas roupas são velhas e o chão, por mais que ela varra, nunca fica limpo.

Ao seu lado – num cenário colorido -, a outra mulher parece ter alcançado o nirvana. Trajando um belo vestido floral, com cabelos soltos ao vento e o sol destacando o brilho do seu rosto, ela varre. Enquanto varre, rodopia. Mal consegue conter o sorriso no rosto. “Por que não comecei a varrer antes?” – pensava. O chão já estava mais do que limpo, mas o que importava? Ela e sua vassoura – que não era muito diferente da sem-cores, salvo por um ou outro botão – formavam o par perfeito.

Você continua andando, seus olhos já irritados com aquele contraste cor/sem-cor. O cenário é sempre o mesmo. Dois homens lavando seus respectivos carros, um em preto e branco, cansado, triste e sujo, lutando enlouquecidamente com uma maneira murcha e de jato fraco. Ele tenta tirar a sujeira do seu velho carro, mas parece que a tarefa é impossível.

O outro é o mais feliz dos homens. Jatos potentes da mais cristalina das águas jorram implacáveis da sua super-mangueira-flexível-de-longo-alcance-a-prova-de-balas sobre o seu carro zero, desmaterializando numa explosão de higiene a sujeira que ali havia.

E são vassouras, mangueiras, faqueiros e panelas. Dois mundos em um só: o inferno preto e branco e o paraíso colorido. O transatlântico apita, hora de partir de novo, o destino é a Ilha do Auditório.

A essa altura da viagem no Transatlântico da Mediocridade, você já está num considerável nível de tédio. O balançar preguiçoso a bordo só aumenta sua irritação. Mas ainda há espaço para mais pólvora antes da explosão. A próxima parada é a Ilha do Auditório, e mesmo antes de desembarcar, você já começa a ouvir o barulho dos aplausos. “Não vai dar certo”, você pensa, mas desembarca.

Ao pisar na ilha, você observa o ambiente. É um lugar pequeno, mas que parece bem maior visto de longe. Tudo é cercado por assentos, a ilha é realmente um auditório. Os lugares estão preenchidos completamente, a maioria deles por mulheres. Algumas pessoas de preto parecem organizar as coisas por ali.

Você fica confuso, mas dá o primeiro passo. Imediatamente uma música toca repentinamente. O público acompanha o ritmo nas palmas, dançarinas começam a fazer alguma espécie de dança tribal antiga, que aparenta não ter o mínimo sentido. É então que um homem irreverente e sorridente chega. Ele é confiante e parece ser amado pelo público. O pessoal de preto rege a situação.

Você não entende mais nada. Só pode ser um evento especial. O homem então vem até você. “Olha só quem tá aqui hoje! E aí, bicho!”. Aplausos. Você olha desconfiado para o homem e responde um tímido “oi”. Aplausos. De repente você é o centro das atenções. Um vídeo mostrando você no trabalho, em casa e no shopping passa. Aplausos. “Que história, bicho! Conta aí agora, o que mais você faz?”, pergunta o homem. Você ameaça uma resposta, mas é interrompido por mais uma onda de aplausos. Como gosta de aplaudir, esse pessoal. É aí que o homem começa a chorar. Ele diz que sua história é emocionante e pede uma salva de palmas. Você tenta sair dali, mas o homem não deixa.

O foco logo muda. O homem logo se esquece da sua emocionante história e chama ao palco cinco mulheres. As mulheres vão entrando uma a uma no palco ao som de uma música do momento. As dançarinas acompanham através de uma nova coreografia. Você tem a sensação de ser a mesma coreografia do início, mas o seu cérebro já está bastante danificado para distinguir (eu avisei sobre o salva-vidas!). Aplausos.

O homem, então, vai apresentando as mulheres. Todas têm nomes de gosto duvidoso, cara de ferocidade carente e querem ser sua namorada. Você nunca viu nenhuma delas na vida. Enquanto você decide quem será o amor de sua vida, mais aplausos, danças bizarras e uma matéria interessantíssima sobre os namoros frustrados de ex-BBB com irmão de MC não das quantas. Então, entre aplausos e coisas sem sentido você ouve o apito. O transatlântico vai zarpar, e você também. Aplausos.

De volta a bordo, você sente estar nos limites dos próprios limites, Alguns passageiros parecem tão angustiados quanto você, outros parecem ter decidido se entregar e simplesmente ficam a vagar com os olhos apáticos, vazios a cada parada. Você percebe que apenas o Capitão parece estar normal. Faz algum sentido, ele apenas guia o transatlântico. Conhece as Ilhas, mas nunca desfruta do seu conteúdo.

Finalmente o barco volta para casa. Você não pode dizer que está cansado, afinal, não fez tanta coisa assim. Mas dormir e passar logo esse domingo é o que você mais deseja. Na segunda-feira, tudo estará normal, não há com o que se preocupar. Pelo menos não até o próximo domingo, quando nas mesmas horas, nos mesmos canais, o Transatlântico da Mediocridade virá te buscar.


terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Rock n’ Roll x Pagodão: O Elo Escondido

Polêmica! Haaaaa!
Leo Santana (esq) e M. Shadows (dir)

O rock n’ roll e o pagode sempre titularizaram uma rivalidade histórica. Geralmente, os adeptos do bom e velho rock n’ roll não são muito chegados ao pagode. Do outro lado, quem gosta de uma quebradeira também nutre sentimentos pouco amigáveis em relação às músicas do capiroto ao rock. São estilos musicais diferentes que representam estilos culturais diferentes. Como as pessoas, em geral, curtem uma confusão, eis a troca de gentilezas constantes entre roqueiros e pagodeiros.

Verdade seja dita, eu, como um amante do rock n’ roll, sempre ficava com um pé atrás quando o assunto era pagode. Entretanto, em um momento de elevação espiritual e busca pelo engrandecimento do ser, resolvi abrir meu coração e observar os dois ritmos, os dois estilos, como quem observa os voos de um pelicano (pelicano voa? Acho que sim, enfim...) e de uma arara. O resultado foi uma descoberta fascinante, ambas voam no mesmo céu. Se você não entendeu nada desse momento poético, vou traduzir: acontece que apesar de toda discrepância instrumental, ideológica e cultural, o rock n’ roll e o pagode têm muita coisa em comum. É com base nessa observação que fiz no meu momento de reflexão que trarei neste post alguns pedaços do elo escondido entre o rock n’ roll e o pagode.

Guardem as facas para depois do post.

A ORIGEM

Não vamos fazer aqui uma análise histórica aprofundada do rock n’ roll e do pagode, e sim observar um ponto comum no despojar dos dois estilos: a origem.

O rock n’ roll, quando ainda estava engatinhando, recém-desgarrado do blues e do R&B, era tocado por homens negros, muitas vezes sem emprego, que vagavam pelo país carregando apenas sua musicalidade e seu violão. A influência da música africana foi muito intensa na formação do estilo. Lá na América do Norte, o rock n’ roll vagava com esses homens pelas regiões mais pobres dos Estados Unidos.

Posteriormente, com o desenvolvimento do estilo, várias ramificações foram surgindo, mas o caráter periférico persistia. O heavy metal, com toda a obscuridade que trouxe nos anos 70; o punk rock, com a rebeldia e o protesto; e o grunge, movimento surgido no interior americano, em cidades onde a madeiraria movimentava a economia, são exemplos de vertentes do rock que nasceram marginalizadas.

Com o pagode não foi diferente. O samba, raiz do estilo, era perseguido antigamente. Se você um dia arrumar uma máquina do tempo e resolver passear pelas ruas do Rio de Janeiro, lá pelas bandas de 1920, tome cuidado. Afinal, quem fosse pego batucando naquela época provavelmente ganharia uma noite grátis no xilindró. Além da iminente marginalidade que era ligada ao estilo, temos mais uma vez a presença da influência africana na formação da musicalidade deste.

O samba também se desenvolveu, e dele surgiram novas ramificações, das quais o pagodão baiano, foco da nossa comparação. Essa modalidade do pagode, assim como ocorreu com o punk, heavy metal e grunge, é um movimento periférico. Muitas bandas de pagode originam das favelas de Salvador e representam o contexto social e a cultura popular desses locais.

Sim, temos países diferentes na brincadeira. Entretanto, estar à margem é estar afastado do padrão em qualquer lugar do mundo. Por conta disso, por serem movimentos periféricos, temos aqui o primeiro ponto de afinidade entre o rock n’ roll e o pagode.

EXPLOSÃO

Outro ponto que achei extremamente familiar ao rock e ao pagode é a questão da explosão. Já tentei explicar isso para alguns amigos, mas descobri que é algo bastante complicado. A oposição entre os dois tipos é tão bem fixada em nossas cabeças que a visualização das afinidades fica comprometida. Mas lembrem-se, hoje é dia de rock de elevação, então vamos começar a subir as “escadarias para o céu” (piadinha rock n’ roll hahahaha, traduza para o inglês e jogue no google se não entendeu :D).

Isso que denomino “explosão” seria a intensidade que é manifestada nas apresentações ao vivo dos dois estilos. Claro, todo tipo de música é capaz de gerar essa empolgação, esse êxtase. Porém, no rock n’ roll e no pagode, essa eletricidade se exterioriza de maneira bem semelhante. A própria música de fato, tanto no rock (mais pesado, especificamente), quanto no pagode, apresenta uma coisa parecida. É aquela zoada, aquela loucura, aquela vontade louca que te dá de aumentar o som (ou gritar para que o desgraçado do cara na rua abaixe aquela porra). O rock e o pagode simplesmente conseguem explodir. Por conta disso, as apresentações ao vivo promovem uma conexão interessante entre público e banda. Se eu fosse viajar mais do que já estou viajando, diria que a “essência da bagaceira” vem da mesma fonte de explosão.

Para ilustrar o que estou dizendo, e você perceber que não estou maluco, vamos assistir dois vídeos curtos:

Esse primeiro é de uma apresentação da banda Avenged Sevenfold. Assista a partir dos 50 segundos de vídeo.

Repare que se você abaixar o volume do vídeo e colocar um CD de Black Style enquanto assiste, encaixará perfeitamente.

Agora o segundo. Veja a partir dos 3:30 min.

Trata-se de uma apresentação de Igor Kannário no carnaval de Salvador. Não há como negar, é a mesma explosão.

TEMÁTICA DAS LETRAS

Bem, nesse ponto vale lembrar que, realmente, a diferença no conteúdo, de forma geral, das letras de rock e de pagode é bastante grande.

Maaaaaaaaas...

Como bons parentes distantes que são - frutos da música africana e nascidos na marginalidade -, rock n’ roll e pagode vez ou outra acabam falando das mesmas coisas sem nem perceber.

Pagode, Rock n’ Roll, não tentem negar, o Elo Escondido existe, vocês têm sua parcela de conectividade. Se não acreditam no que digo, separei uns versos para mostrar a vossas maestrias.

 Primeiramente, vamos ver os dois primeiros versos da música “Cigaro”, da banda System of a Down:

“My cock is much bigger than yours
My cock can walk right through the door”

Bem, como isso aqui é um blog de respeito, não vou traduzir literalmente o trecho. Entretanto, cabe dizer que o eu-lírico, nos versos em questão, se gaba por ter uma característica masculina muito mais avantajada do que a do seu interlocutor. Para enfatizar a diferença, ele ainda afirma que essa característica consegue atravessar pela porta, devido ao seu comprimento.

Agora vamos analisar os versos do refrão da canção “Rala a Tcheca no Chão”, do Black Style:

“Rala a tcheca no chão, chão
Rala a tcheca no chão, chão chão chão
Rala a tcheca no chão,
A tcheca no chão, a tcheca no chão, mamãe...”

Trata-se de um incentivo, camuflado por eufemismo e metáforas poéticas, a realização de movimentos, por parte da mulher, que remetem a atos libidinosos.

Em ambos os casos, rock n’ roll e pagode trouxeram em suas músicas expressões de conotação sexual, as quais podem causar incômodo ou constrangimento em pessoas de moralidade mais rígida. Essas expressões não são mais do que manifestações do contexto marginal intrínseco ao rock n’ roll e ao pagode.

Mas não há só lado negro nas músicas. Vamos ver mais alguns versos. Primeiramente, um trecho traduzido da canção “In the Ghetto”, interpretada pelo Rei do Rock, Elvis Presley.

“E a fome aperta
Então ele começa a vagar nas ruas à noite
E aprende a roubar
E aprende e lutar
No gueto

Então em uma noite de desespero
O jovem foge
Compra uma arma, rouba um carro,
Tenta fugir, mas não chega longe
E sua mãe chora”

Agora o refrão da música “Realidade Dura da Favela”, do Fantasmão.

“Gueto, preto, pedra
Morre ou vai pra cela
Realidade dura da favela”

Antes dos comentários, vejamos outra parte de “In the Ghetto”.

“E sua mãe chora
Porque se existe uma coisa que ela não precisa
É outra boca faminta para alimentar
No gueto”

De volta ao Fantasmão.

Mesmo que a dor seja preciso
Feijão faltou
Guri chorou
Desmoronou”

Esses trechos são interessantes. Canções de épocas diferentes, estilos diferentes, países diferentes, mas com muita coisa em comum. Percebemos, claramente, a descrição de uma vida nas favelas, nos subúrbios marginalizados. Rock n’ Roll e Pagode, ritmos tão separados culturalmente, mas falando da mesma coisa, da mesma forma. O motivo é não outro senão a necessidade de olhar para si mesmo. Em ambas as canções o que temos é a expressão da triste realidade que serve de berço para esses tipos musicais. Esse é mais um ponto de afinidade entre rock e pagode.

E como menção honrosa, vamos deixar apenas o título de duas canções, onde o eu-lírico necessita ouvir o lamento do seu instrumento musical.

-While My Guitar Gently Weeps (Enquanto Minha Guitarra Chora Gentilmente), Beatles.

-Mandei Meu Cavaco Chorar, Harmonia do Samba.

DEDICAÇÃO DOS ADEPTOS

Para encerrar essa comparação inusitada, mas possível, vamos falar dos adeptos. Sim, porque sem eles não haveria polêmica nenhuma para comentar, nem Elo Escondido para revelar.

Por mais louco que possa parecer, uma das coisas que assemelha o pagode e o rock são justamente os fãs de cada estilo. Quando digo fãs, ou adeptos, me refiro aos militantes radicais, aqueles que só vislumbram o rock n’ roll e aqueles que nada mais percebem além do pagodão. Esses adeptos são fiéis à ideologia do estilo que seguem de maneira bastante intensa. Essa devoção ocorre no modo de se vestir, nas expressões utilizadas na comunicação, nas opiniões, no modo de se relacionar com os outros e, é claro, nas músicas que ouvem. Claro, todo estilo, não musical apenas, mas ideológico, tem suas características e peculiaridades. Mas por que estou destacando o rock n’ roll e o pagode? Não, não é só porque o texto é sobre isso.

Posso está completamente errado em relação a tudo que falei até agora. Muita gente vai discordar também. Mas, a meu ver, quem é verdadeiro militante do rock n’ roll e do pagode tende a ser mais fechado do que os militantes de outros seguimentos. Talvez por conta disso haja essa rivalidade entre roqueiros e pagodeiros. A ideia de “cabeça aberta” presente nos dois estilos parece não se aplicar quando o assunto é aceitação do outro. Quando digo outro, digo outro no sentido deles mesmos. Traduzindo. O roqueiro não é cabeça aberta em relação ao pagodeiro, assim como o pagodeiro não é em relação ao roqueiro. Não estou dizendo que é hora de vestir a camisa do Maiden e baixar um CD da Bronkka (eu mesmo não me sinto nenhum um pouco com vontade de fazer isso), ou de apagar o CD novo do Kole i Pan e botar Metallica no paredão, e sim que expor fragilidades em questões que dizem respeito a gosto é um desgaste totalmente inútil.

Moral da história: os adeptos, roqueiros e pagodeiros, por ficarem trocando gentilezas, acabam se aproximando e fortalecendo o Elo.

FINAL, FINALMENTE.

Apois, após falar (falar bastante, mais do que eu esperava) de tudo isso, chegamos, finalmente, ao fim da nossa comparação. Como eu disse anteriormente, não é fácil explicar que rock e pagode são coisas parecidas. Se você conseguiu captar alguma coisa, parabéns, você já começou a subir a Escadaria. Se você não entendeu nada, comece a buscar a elevação. Se você discorda de alguma coisa, de tudo, ou quer apenas se manifestar, não deixe de comentar aí embaixo. Até a próxima e lembrem-se, o poder é de vocês! (????)

PS: Para arrebatar, um videozinho mostrando duas coisas:

      1) Os comentários do rapagão que postou o vídeo não são legais e não condizem com o Elo.
      2) O vídeo mostra rock n’ roll e pagode bebendo da mesma fonte.

Valeu!


domingo, 14 de dezembro de 2014

Feiura e Eu


Bem, sentir-se feio é algo comum no meu dia-a-dia. Feiura e eu formamos uma parceria que chega a ser romântica. Ela me persegue, me bate, me morde, me desarruma. Tudo isso no sentido literal, imaginário, extragaláctico.

Quando acordamos, a feiura e eu vamos ao banheiro juntos. Lá chegando, ela sussurra no meu ouvido palavras de carinho. Imediatamente parece que há algo errado com minhas orelhas. Por que elas estão tão vermelhas? Nada demais.

Tomamos banho. Após o banho, reparo uma espinha nova dando o ar da graça no canto da minha boca. A feiura diz: “Vai lá, espreme!”. Como recusar tamanha doçura num pedido? Espremo a espinha e ela se transforma magicamente em um mandacaru gigante e enfurecido, com pitadas de vulcão. Respiro.

Prestes a sair do banheiro, a feiura lembra-me que devo pentear o cabelo. Como pude esquecer? E ela, tão gentil, me entrega o pente. Começa a batalha. Parece que de repente meu cabelo recebeu a encarnação de Goku no nível super sayajin 3 fundido com Cauby Peixoto, porém sem os requintes de fodão. A frente vai para o lado, o lado vai para frente, o fundo fica pra cima e eu desisto dessa batalha. Nem Shen-Long daria jeito.

Começo a brigar com a Feiura, nosso relacionamento é muito bipolar. Digo que está tudo acabado. Ela olha nos meus olhos e me diz: “nunca vou te deixar”. Estamos bem de novo. Penso em raspar a cabeça. Penso melhor e desisto da ideia.

Vou até o guarda-roupa, pego minha camisa mais bonita. Feiura diz que ficará bem em mim. A camisa está impecável, lisa e macia como um travesseiro nas lojas americanas (?). Visto. Que estranho, de repente a camisa tem mais lombadas do que a saída de Serrinha pra Coité. Parece que estou vestindo um boneco de posto de gasolina.

Chego à rua. As pessoas me olham estranho. Não aceitam meu romance com Feiura. Ela não se importa, está sempre comigo. Quando saímos no fim de semana à noite, ela sempre me mostra aquelas pessoas estranhas, cabelos penteados e rostos sem “detalhes”. Damos risadas. Na hora de dormir, Feiura pede para que eu vista aquele shortinho curto, azul e com bolinhas brancas. Afinal, nosso relacionamento vai muito além do corpo...


sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Breganation #1: “Baby, Can I Hold You?” – Tracy Chapman


Quando falamos em uma coisa “brega”, geralmente nos remetemos a algo cafona, de suposto mau gosto. De forma geral, muitas vezes o brega acaba sendo aquilo que temos vergonha de dizer que gostamos, o que é uma grande bobagem.

A definição de brega no ramo da música se relaciona aos versos simples, exagerados, alcoolizadamente românticos e de fácil assimilação. Mas pensar que essa combinação faz com que uma música seja de baixa qualidade é apenas mais uma grande bobagem. Se deixarmos de ladainha e prestarmos atenção, perceberemos que, muitas vezes, aqueles versos choramingados dizem a mais pura verdade. Vai depender dos ouvidos do momento. Claro, também existem músicas bregas ruins. Aliás, se existe uma classificação possível para a música, seria a seguinte: música boa, música ruim. Mas nem isso é absoluto, depende do ouvido.

Mas deixemos de lado os gostos e vamos para os fatos. Para provar que o brega é uma questão relativa, inauguramos hoje a série “Breganation”. A ideia é a seguinte: vamos pegar algumas músicas consagradas dentre os mais diversos seguimentos musicais e mostrar que elas poderiam, facilmente, ser gravadas por Zezo. Como faremos isso? Basear-nos-emos pela observação dos seguintes aspectos: 1) Simplicidade; 2) Exagero; 3) Romantismo Encachaçado; 4) Ficar na Cabeça. Após a análise de cada ponto, atribuiremos de 1 a 5 Estrelas da Paixão, chegando a uma média final que será a pontuação no nosso Bregômetro.

Sem mais delongas, vamos ao que interessa. Para começar o Breganation, vamos ver o vídeo abaixo:




Trata-se da música “Baby, Can I Hold You?”, lançada em 1988 por Kenan de “Kenan e Kel” pela cantora americana Tracy Chapman. A música foi o maior estouro, sendo tocada até hoje. Quem ouve rádios como a Globo FM, ou A Tarde FM sabe que essa canção é um verdadeiro clássico.

Pelo próprio título, “Baby, posso te abraçar?”, já sentimos vontade de vestir a roupa de bicheiro e sair caminhando pelas calçadas da vida às 3h da manhã. O resumo da obra é basicamente o seguinte: Kenan...quer dizer...Tracy está visivelmente retada com seu chamego, já que o rapaz parece só fazer lambança.

A causa dos problemas da dupla parece ser a dificuldade encontrada por ambos na hora de conversar. “Desculpe”, “perdoe-me” e “eu te amo”, aparentemente, é tudo que o rapagão consegue dizer, já que vive aprontando e machucando o coração da cantora.

Os anos passavam e ainda assim o moleque não conseguia juntar umas sílabas diferentes. Tracy gostaria que ele dissesse “baby, posso te abraçar esta noite?”, ao invés de ficar só de migué. Para arrebatar, ela conclui que a é culpa dela (???), já que tudo teria sido diferente se ela tivesse dito a coisa certa, na hora certa.

Hora de colocar no Bregômetro. Minha avaliação é a seguinte:

1)   Simplicidade: Logo de cara você percebe a problemática. Tracy faz questão de deixar perfeitamente claro que as palavras do rapaz não vêm facilmente. Essa dificuldade é enfatizada em três estrofes, exatamente da mesma forma. Ai vem o refrão para arrebatar. A cantora sofre, nós sofremos, todo mundo se compreende e a verdade foi transmitida. Ela queria simplesmente ser abraçada. Eu entendi, tenho certeza que você entendeu também. Foi tão simples que até mesmo o malandrão da canção talvez tenha entendido. Sendo assim, 5 Estrelas da Paixão para esse quesito.

“Desculpe/ Perdoe-me / Eu te amo
É tudo que você pode dizer
Os anos se passaram e ainda
As palavras não vêm facilmente
Como 'desculpe-me'/ ‘Perdoe-me’/ ‘Eu te amo’ “

2)   Exagero: Bem, como o foco principal das preocupações de Tracy é o descaso afetivo do seu par, e ela tratou de deixar isso bem explícito – como visto acima.Não precisou exagerar para mostrar sua sofrência. Entretanto, vale ressaltar que reduzir o vocabulário do rapaz a três expressões, e repetir isso durante toda a música, para enfatizar bem, bem, bem enfatizado, é, no mínimo, digno de 3,1 EPs.

3)   Romantismo Encachaçado: Critério interessante este. O que seria o “Romantismo Encachaçado”? Tem sua parcela de parentesco com o exagero, mas acho que o importante aqui é mais especificamente o conteúdo do que foi exagerado. Seria, mais ou menos, aquela viajada que a pessoa dá às vezes, sendo mais comum quando se tem a influência alcoólica. Tracy ia até bem nesse quesito, parecia bastante sóbria. Até que ela diz, no final do refrão: “talvez se eu tivesse dito as palavras certas, na hora certa, você seria meu”. Não, Kenan Tracy! Pense comigo, você disse o tempo todo que o seu macho tem problema de expressão, que ele só sabe pedir desculpas, e agora você me diz que foi você quem falou as coisas erradas? Que confusão, cara. Mas foi genial, 4 EPs pra você nessa.

4)   Ficar na Cabeça: Talvez o mais subjetivo dos critérios. Não há muito o que se dizer aqui. Com exceção de algumas músicas, que só podem sofrer de alguma influência sobrenatural para ficarem martelando tanto em nossas mentes durante períodos de explosão de Namekusei, uma música pode ficar na cabeça de algumas pessoas mais do que outras. Com base nisso, vou na pessoalidade: 3,4 EPs para esse quesito.

Após esse estudo, chegamos a um resultado no nosso Bregômetro! E o nível de breguice da canção “Baby, Can I Hold You?” é de:

3,9
ESTRELAS DA PAIXÃO!

E você ai de casa? Deixe seu comentário com suas notas em cada quesito e vamos descobrir a escala global de breguice dessa música. Você também pode deixar sugestões de canções que te fizeram usar a pochete, aí mesmo nos comentários, ou pelo e-mail rafaelverdival@gmail.com


Até o próximo Breganation!


terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Meu sobrenome e Eu



Bem, antes de falar das coisas que estou pretendendo nesse humilde blog, gostaria de fazer uma observação. Vamos considerar que eu não seja, necessariamente, uma pessoa. “Que loucura é essa, man?”, você pode estar se perguntando. Vou explicar: para que eu possa realizar as observações pretendidas sem me auto escaldar, preciso me considerar como uma abstração personificada. Em outras palavras, vou me considerar um modelo ideal de ser humano, alheio a qualquer inclinação propiciadora de críticas ou elogios. Dito isso, vamos ao que interessa.

Meu nome é Rafael e meu sobrenome é Verdival. Não sei o que meu sobrenome significa, tampouco sei se realmente significa alguma coisa. O que eu realmente sei é que ele está grafado em português, logo, não tem nenhum segredo na sua pronúncia. Deixando de lado a epistemologia do meu sobrenome, gostaria de afirmar: eu gosto do meu sobrenome. Acho legal, gosto de como soa, gosto das formas das letras quando está grafado no papel. Além disso, acho um nome absolutamente fácil de ser compreendido. Entretanto, acho que essa opinião não é universal.

Há algum tempo eu tenho enfrentado problemas cognitivos quando o assunto é meu nome. Para começar, vou citar o próprio Word. Sim, o Word, nossa máquina de datilografar do terceiro milênio, como diria Galvão Bueno. O Word conspira contra mim, posso sentir isso. Toda vez que digito “Verdival” em suas alvas páginas virtuais, sou obrigado a admitir a presença daquela intimidadora linha vermelha abaixo do meu humilde vernáculo referencial. É como se o Word olhasse nos meus olhos e dissesse: “Vai aprender a escrever seu nome, babaca!”.

É triste, mas é verdade. Houve um tempo em que eu tentei resistir à tamanha opressão. Clicava com o botão direito sobre o “Verdival” e procurava a opção “ignorar”. Parei com isso. O motivo é simples. Sempre que eu clicava com o botão direito sobre meu nome eu era obrigado a visualizar as sugestões que o maravilhoso Word trazia para corrigir minha ignorância nominal. A lista era considerável, e nela havia coisas maravilhosas como: Vendaval, Vertical, Vendível e, não me pergunte por que, Percival (corta pra mim). Passei a odiar linhas vermelhas.

Saindo do universo virtual, ingressamos na realidade, mas as coisas nem sempre são diferentes. A resistência ao novo deixa as pessoas tão criativas que até mesmo Da Vinci ficaria com recalque. Admito, Verdival (maldita linha vermelha) não é um nome que você vê por aí todo dia. Eu mesmo só conheço meu pai e eu. Mas pera aí, não é tão difícil assim de entender! Vamos lá, é simples: pegue uma das cores da bandeira nacional e junte com o apelido de alguma fazedora de lanches habilidosa. Eis então meu sobrenome, Verdival. Não foi fácil? Então só pode ser preguiça de ouvir.

Mas eu não sou como o Word. Não, eu não corrijo. Quem sou eu pra corrigir alguma coisa? Por conta disso, acho que já fui chamado de mais nomes do que aipim ao redor do Brasil. Em determinada ocasião, estava eu na escola, quando a professora fez uma pergunta sobre o assunto dado. Como ela se referiu a mim? Verdevale. Não me importei. Ora, ela pode ter entendido mal, foi um engano sutil. Quem sabe ela não pensava em algum campo de gramíneas que ela gostaria de estar naquele momento? Seguimos, então.

Tempos depois, conversávamos eu e um cara na academia. Assunto polêmico, o uso de anabolizantes. O cara era entendido do assunto, falava sobre os prejuízos à saúde por conta dessas substâncias, eu concordava com ele. Conversa interessante, até que ele larga: “Esses caras que usam anabolizantes acabam com a própria saúde, né não, REDVALE?”.

Pausa para refletir. Redvale. Quanta classe, quanto técnica criativa, quanto astúcia. Essa foi, sem dúvida, uma das melhores variações do meu nome que já vi. Não só trocou a cor, como trocou o idioma. Simplesmente fantástico. Tudo que pude pensar foi que o Vale Verde que minha professora imaginava se localizava em algum lugar na Califórnia e estava pegando fogo naquele momento.

E assim vem sendo. Acho que atualmente sou capaz de responder por qualquer palavra que termine com algo que soe parecido com “au”. Isso porque já respondi por coisas como: Verdevale, Valverde, Redvale, Bérdival (?), Verde e Oval, Verde Val, Landeslau e etc. Parece mentira, mas acredite, não é.

Porém, não pense que isso me irrita, ou que eu não gosto. Acho até interessante. As pessoas simplesmente estão ocupadas demais pensando nos próprios nomes para se importarem com os dos outros. Solução prática foi a encontrada por alguns amigos. Chamam-me de Verdi. Como diria Jack Sparrow, é simples, fácil de lembrar. Mas é claro que esse apelido já evoluiu. Chamam-me de Verde agora.