O dia não começa sem uma boa dose de café. Para muita gente – e eu me incluo nesse grupo – o dia sequer prossegue sem uma caneca caprichada da bebida sagrada. A verdade é a seguinte: café é bom demais. Se você aprecia essa lendária bebida, sabe do que eu estou falando. O aroma estonteante e o sabor ímpar provocam sensações apoteóticas em qualquer mortal.
E
foi bebendo uma caneca quente de café que eu comecei a indagar: quem foi o
gênio que trouxe tamanha maravilha para a humanidade? Como diriam Rick e
Renner: é coisa de Deus.
Será
que alguém, em um dia de tédio, pensou: “Nada para fazer. Já sei! Vou colher
frutinhas vermelhas, colocá-las para secar ao Sol, torrar os grãos, moê-los até
virarem pó, misturar o pó com água fervendo e beber!” Intrigante.
Movido
pela curiosidade que se espalhava pela minha alma enquanto eu respirava o
saboroso aroma do café na minha caneca, resolvi buscar a resposta para tal
mistério. Tomei um gole caprichado, quase queimando minha língua no processo, e
fui até o grande Oráculo – o Google. Compartilharei minhas descobertas com
vocês nas próximas linhas.
Eram
meados do século VI, antiga Abissínia (atual Etiópia). Tikusi Buna havia
acordado cedo, como de costume. Geralmente não tinha dificuldades em se
levantar juntamente com Sol. Porém, naquele dia em especial, se sentia muito
sonolento. Talvez fosse efeito da noitada anterior. Nunca mais iria beber,
havia prometido para se mesmo.
A
esposa de Tikusi ainda dormia quando o abissínio saiu de casa. Ele era pastor e
precisava levar suas cabras para pastar. As pobrezinhas eram seu ganha pão e
não podiam ser negligenciadas por conta da ressaca. Por conta disso, seguiu com
o rebanho até os campos.
Terminado
o pastoreio, ao final da tarde, Tikusi percebeu que as cabras estavam
estranhas. Os animais pareciam eufóricos. Saltavam e berravam sem parar. Guiar
as criaturas até sua roça foi uma tarefa árdua para nosso herói – que, aquela
altura, estava com a cabeça prestes a explodir.
Para
a surpresa do bom pastor, o peculiar comportamento de suas cabras persistiu nos
dias seguintes, sempre após o pastoreio. Agitação, saltos e berros. Diante do
contexto, Tikusi Buna começou a considerar a interferência sobrenatural como
causadora daquela misteriosa forma de agir dos bichinhos. “Talvez as cabras
estejam possuídas por algum demônio” – pensou Tikusi.
Confuso
e preocupado, o bom pastor procurou seu amigo de longa data, o monge Buruki,
para solucionar aquela questão de outro mundo. Buruki era especialista em
exorcismos de cabras. Já havia despachado mais de 50 espíritos do mal para fora
dos caprinos. O problema seria solucionado com certeza.
Soturnos,
mas determinados, os integrantes daquela improvável caravana – pastor, monge e
cabra - partiram para os campos à primeira luz da manhã. Buruki, com seus olhos
treinados de monge, observava as cabras comendo a vegetação do lugar. Ao menor
sinal de possessão, ele agiria. Eis que o pastor Tikusi percebeu algo intrigante:
as cabras – como que já acostumadas – pastavam organizadamente até uma curiosa
planta. Era uma árvore pequena, cheia de folhas e com frutos avermelhados. Uma
a uma, as cabras foram comendo os frutos da árvore. Poucos instantes depois, a
intrigante agitação começava novamente. Saltos e berros movimentavam o
ambiente.
Tomando
notas do ocorrido, o monge Buruki coletou algumas das frutas vermelhas e
guardou dentro do bocapiu que carregava. Mais tarde, naquela noite, juntamente
com Tikusi e outros monges, ao redor da fogueira no centro da tribo, algo
fantástico aconteceu.
As
fontes não são cem por cento seguras, mas todas as evidências levam a crer que
– possuído pelo espírito de uma cabra ancestral que havia morrido por overdose
da fruta vermelha – o monge Buruki deu início ao ritual de transformação da
frutinha. Colocou-as para secar, torrou-as, moeu-as, misturou o pó com água
fervente e bebeu o drink recém
preparado. Os outros monges e o pastor Tikusi experimentaram aquela bebida
exótica também.
O que
aconteceu em seguida marcou a humanidade para sempre. Poucos instantes após
provarem do café pela primeira vez, monges e pastor sentiram a mesma euforia
que possuía as cabras todas as noites. Rapidamente, humanos e caprinos se
agitavam, saltavam e berravam.
E
foi assim, meus amigos, que - em uma noite alegre na Etiópia do século VI – a
bebida mágica, o elixir da energia, dava as caras na Terra para nunca mais
partir.
Hoje
em dia, o café é quase tão importante quanto a água. Alguns gostam de beber
para começar o dia radiante. Outros bebem café para dormir – conheço gente
assim. E realmente dormem – aquele sono tranquilo dos bem cafeinados.
O
café está em toda parte: salas de espera, mesas de buffet, casas de família. Alguns
dizem que podem sentir a cabra ancestral saltando e berrando dentro de si após
uma boa xícara.
Mitologia
à parte, são inegáveis as benesses do café para os seres-humanos. A ciência
mostra que – por conta dos agentes antioxidantes presentes em sua composição,
bem como sua da capacidade estimulante – o café é um grande aliado na prevenção
de doenças como o câncer e a osteoporose.
Ainda,
é arma eficaz contra a depressão, abaixando em grande quantidade as chances de
um indivíduo cometer suicídio. Isso ocorre pois o café funciona como
antidepressivo. O estímulo que a bebida causa ao sistema nervoso central
aumenta a produção de neurotransmissores no cérebro, como a serotonina,
dopamina e noradrenalina.
Pois
é, meus amigos, o café é bom e faz bem. Mas, como tudo na vida, é importante
evitar os excessos. Quantidades exageradas de cafeína podem causar transtorno
mental temporário e abstinência. Ainda, se você se afogar no café – coisa que
dá vontade de fazer – você pode sofrer de inquietação, nervosismo, desconforto
gastrointestinal, insônia. Sendo assim, beba com moderação.
O café aquece o corpo
e a alma. Ajuda na hora de estudar, de trabalhar, de matar a fome. Para tirar o
melhor que essa bebida fantástica tem a nos oferecer, pegue leve na dose. Caso
contrário, você pode acabar como a cabra ancestral e sofrer uma overdose. Dito
isso, vou encher a minha caneca. Que Tisuki, Bukuri e a cabra ancestral estejam
com vocês. Até a próxima.
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